sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Jesus, o Libertador no Templo

And the birds gathered around him, and welcomed him with their song, and other living creatures came unto his feet, and he fed them, and they ate out of his hands. - Lection XXXIV, 3, Gospel of the Perfect Life

Uns dias antes da Páscoa dos judeus, Jesus e os seus seguidores chegaram a Jerusalém e dirigiram-se ao Templo. Quando chegaram, Jesus nem podia acreditar no que via. O Templo estava cheio de vendedores de gado, de ovelhas, de pombas, animais que os peregrinos compravam para oferecer em sacrifício para a purificação da alma. Havia ali também uns cambistas, que trocavam o dinheiro dos peregrinos para que pudessem comprar. Jesus encheu-se de indignação: fez sair dali todos os animais, derrubou as mesas, e disse:

- Saiam daqui! Esta é uma casa de oração, mas transformaram-na num covil de assaltantes. Não derramem sangue inocente neste lugar!

Mas... esta história não se parece com a versão que normalmente se conta... Pois é. Tal como em muitas outras ocasiões, também aqui foi distorcida a mensagem de Jesus. O ponto principal da revolta, o sacrifício animal, foi obscurecido, e um outro aspecto, bastante irrelevante para o caso, ganhou proporções desmedidas. Jesus não se estava a revoltar contra o "comercialismo" ter tomado conta do Templo.

Vejamos então. De acordo com todos os evangelhos, Jesus dá primeiro atenção aos animais, não aos cambistas. E a palavra que usa, aliás, que cita, é bastante significativa. A diferença entre "ladrão" e "assaltante" no tempo de Jesus é bastante clara: um ladrão é alguém que rouba uma maçã no mercado, um assaltante é aquele que diz "a bolsa ou a vida" e fala a sério. Simplificando: alguém que não se importa de matar para com isso lucrar. A ideia de assaltante está ligada a violência. Como disse, as palavras de Jesus são uma citação do profeta Jeremias:

Este é o Templo do SENHOR. Se endireitares os vossos caminhos e emendares as vossas obras, se verdadeiramente praticardes a justiça uns com os outros, se não oprimirdes o estrangeiro, o órfão e a viúva, nem derramardes neste lugar o sangue inocente, se não seguirdes para vossa desgraça, deuses estrangeiros, então Eu permanecerei convosco neste lugar. Mas voltais a cometer todas essas abominações. Porventura, este templo, onde o meu nome é invocado, é a vossos olhos um covil de ladrões?
(Jr 7, 4-9, abreviado)

Estas palavras foram proferidas por Jeremias à entrada do Templo. Jesus imita este comportamento destemido, e cita o seu modelo. Mas como vemos, Jeremias não se insurge contra os cambistas. Na verdade, nem sequer lhes faz menção, o que não é de espantar, já que não existiam no seu tempo. Mas não há no discurso de Jeremias nenhuma referência ao comercio à volta da religião, sequer, mesmo apesar de usar o termo ladrões (assaltantes). Todas as suas acusações são contra os princípios morais. E apesar de o roubo, supostamente praticado pelos cobradores, ser errado, o pecado maior é o derrame de sangue inocente.

Aliás, é ingénuo pensar que Jesus estava apenas a acusar os cambistas de roubarem os peregrinos. Porque é que "o povo, ao ouví-lo, ficava suspenso dos seus lábios" (Lc 19, 48)? Se Jesus estava apenas a falar contra o roubo, não há nisso nada de extraordinário. Porque é que o povo ficava surpreendido? Mas se a sua crítica era ao sacrifício animal... Era no mínimo um ensinamento invulgar, já que entre Jeremias e Jesus não há registos de ninguém que se tenha oposto tão veementemente ao sacrifício. Os sacerdotes e os doutores da Lei, tentando preservar a sua autoridade, começaram então a conspirar para matar Jesus. Será que o fariam se ele apenas refutasse o comércio no Templo? O desafio a um dos pilares do judaísmo da altura é uma hipótese bem mais provável.

Há outras histórias, noutros evangelhos, que mostram este lado de Jesus, como a vez em que libertou uns pássaros, ou quando persuadiu um homem a não caçar. Tudo isto corrobora a teoria que diz que Jesus fazia parte de um grupo judeu que rejeitava a Lei corrompida e seguia a verdadeira Lei de Deus dada a Moisés, os Essénios. Este grupo não se dirigia ao Templo por desaprovarem dos sacrifícios de sangue que ali tinham lugar. Eram também vegetarianos. Mas disto falarei noutro dia.

Termino com uma frase que disse há uns tempos a alguém: Yeah, Jesus was pretty much an animal liberationist. Fossem todos como ele! Porque o bom senso, a compaixão e os princípios não chegam, é preciso agir também.

Se vos apetecer, vejam isto. Apesar de não ser historicamente exacto, não deixa de ser fantástico.

1 comentário:

Cate disse...

Parece-me óbvio também que ele não aprovaria esses sacrifícios de animais. :)